terça-feira, 10 de dezembro de 2013

o exercício da tese

Uma consideração sobre a perpetuação da arte, ou porque Van Gogh ainda prejudica certos entendimentos.

Van Gogh foi o escolhido para ser o protótipo do artista moderno. Nele, existe a ideia do incompreendido, sofrendo pela ignorância de tudo e de todos, despejando toda a imensa subjetividade do ser em pinturas para além do seu tempo. Reverbera assim na contemporaneidade, ainda, um tipo único de sujeito baseado nesse pensamento: o artista-romântico, ou na expressão de Artaud, um "suicidado pela sociedade", vanguarda do seu tempo.

A orelha amputada, símbolo máximo na utilização feroz do mercado, legitima a loucura e um tipo de pensamento para qualquer aspirante a artista. É interessante perpetuar a tese de que são os outros que não compreendem o que existe no "mais-alto-fundo-âmago-do-seu-ser". Nisso, todo um mercado de críticos, curadores, universidades e professores estão lá para apoiar e dizer que todos tem um alto coeficiente de criatividade e inovação. A criação não seria um simples jorro na imensa linha do tempo, no sentido de extrapolar o sentido de hereditariedade dos genes por meio dos filhos.

Talvez seja essa a razão do porquê os cursos livres de artes proliferem mais que baratas no verão. O mercado lucra, e muito, com toda a ignorância e síndrome de um romantismo tardio. Pois se houvesse um curso em que os professores, ao verem o desenho do aluno dissessem em alto e bom tom: Não passarão!, seriam muitos os que repensariam um curso de direito ou administração ora antes nunca navegados.

Não que a falta de talento seja inibidor para aquele que busque maior expressividade. Mas a herança herdada, (não racionalmente por Van Gogh, mas a todos outros que se beneficiam) ecoam para uma série de jovens artistas, esperando na fila alguém que vislumbre esse raio de sol.

Racionalidade e expressão caminham juntos na mesma muleta de alguém não apenas "gauche", mas também "droit". De um lado, a possibilidade de entender que a produção artística anda junto com um senso de autonomia. No outro pé, o trabalho duro, muito duro. O que rege o que irá ficar ou não para a posteridade independe do desejo do próprio artista. Não são todos que caem na fina malha do tempo, mas às vezes fatores de estar no lugar certo, na hora certa, também ajudam na grande corrida ao ouro.

Nem todos tem um irmão como Theo para assegurar um conforto e sobrevivência necessário para o grande tempo. Nem todos poderão ser o joguete de um dispositivo mercadológico. Mas, na melhor das hipóteses, sempre haverá enriquecimento de alguma parte que lucra com anseios e sonhos. E se for artístico, melhor ainda.

Nenhum comentário:

Postar um comentário