quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

a. arquivar

a potência, no final das contas, esvaziou até se tornar nula. foram vinte minutos de conversa. um porteiro confuso e uma despedida enfadonha e desnecessária. não era dele o problema, mas, de alguma forma, a presença corporificada de um cansaço. o fim de algo que mal tinha começado. agora, como o sempre e tudo mais, empurrar uma pequena história para debaixo do tapete. e seguir em frente.

domingo, 22 de dezembro de 2013

2013

2013 foi o ano que voltei para São Paulo, temporário e definitivamente. Foi a cidade que eu elegi como provisória diante a vôos mais altos, mas ao mesmo tempo, cidade do coração a quem devo minhas origens. No começo, algumas viagem pelo interior. São Sebastião da Grama, Ribeirão Preto. No meio, mais para o final, vieram Florianópolis, Porto Alegre, Pelotas, Montevideo, Colônia do Sacramento, Buenos Aires e encontros incríveis em meio a um coração escancarado por experiências.

das vivências existiram desde o choque da decepção e o retorno àquele lugar escuro (na hora da zona morta, carinhosamente apelidada), até a busca por uma salvação constante. Muita ansiedade diante isso. Mudança para uma casa de ecos inspiradora e deprimente. o tkd como terapia e o forma encontrada para fortalecimento do corpo e do espírito.

um amor de porto em São Paulo. outro, estrangeiro. o entendimento que é sempre bom estar fora do lugar que habitamos. (assim me torno uma pessoa melhor, acho). ah, e claro, um amor em potencial ainda embrião.

e enfim, terminar (ou começar) em um lar temporariamente definitivo. fazer daqui, meio ao caos da urgência da sobrevivência uma casa para hospedar sonhos e desilusões. é difícil prever o futuro. dá um frio na barriga danado porque ano que vem será o ano da defesa e desconheço para onde os ventos me levarão. mas, a sensação de que as coisas começaram, de fato, agora, continua. como a tulipa que apareceu no sonho. avermelhando-se aos poucos junto a pequenas certezas. e o entendimento que tudo o mais que virá é construído aos poucos pelo dia-a-dia.

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

o exercício do diálogo

Portaria internacional

- Oi!

- Oi.

- Você é da onde?

- Por quê?

- Esses olhos, é italiana?

- Não.

- Japonesa?

- Não.

- São tão familiares. Você é da vizinhança?

- Não.

- Tem certeza?

- Aham.

- Já te vi. Você não vem sempre aqui?

- Não sou daqui.

- Sabia! Pelo andar, brasileira, não é?

- Aham.

- Isso foi um sim ou um não?

- Dali de perto.

- Ah, o Rio de Janeiro. Ele continua lindo?

- Não sei.

- Olha, eu não queria te dizer. Mas você tem olhos lindos.

- Obrigada, puxei do meu pai.

- Se são tão lindos quanto os seus, parabéns a ele. Ele deve ter um porte.

- Não tem.

- Se você se sentir a vontade, pode me falar sobre isso…

- A fila andou. Vai entrar?

- Vou, vim visitar meu irmão, roubo.

- Eu, meu pai.

- Seu pai?

- É, homicídio, 30 anos.

- Matou sua mãe?

- Não, meu namorado. Ele está vindo, quer conhecê-lo? Ele vai adorar seus olhos.

terça-feira, 10 de dezembro de 2013

o exercício da tese

Uma consideração sobre a perpetuação da arte, ou porque Van Gogh ainda prejudica certos entendimentos.

Van Gogh foi o escolhido para ser o protótipo do artista moderno. Nele, existe a ideia do incompreendido, sofrendo pela ignorância de tudo e de todos, despejando toda a imensa subjetividade do ser em pinturas para além do seu tempo. Reverbera assim na contemporaneidade, ainda, um tipo único de sujeito baseado nesse pensamento: o artista-romântico, ou na expressão de Artaud, um "suicidado pela sociedade", vanguarda do seu tempo.

A orelha amputada, símbolo máximo na utilização feroz do mercado, legitima a loucura e um tipo de pensamento para qualquer aspirante a artista. É interessante perpetuar a tese de que são os outros que não compreendem o que existe no "mais-alto-fundo-âmago-do-seu-ser". Nisso, todo um mercado de críticos, curadores, universidades e professores estão lá para apoiar e dizer que todos tem um alto coeficiente de criatividade e inovação. A criação não seria um simples jorro na imensa linha do tempo, no sentido de extrapolar o sentido de hereditariedade dos genes por meio dos filhos.

Talvez seja essa a razão do porquê os cursos livres de artes proliferem mais que baratas no verão. O mercado lucra, e muito, com toda a ignorância e síndrome de um romantismo tardio. Pois se houvesse um curso em que os professores, ao verem o desenho do aluno dissessem em alto e bom tom: Não passarão!, seriam muitos os que repensariam um curso de direito ou administração ora antes nunca navegados.

Não que a falta de talento seja inibidor para aquele que busque maior expressividade. Mas a herança herdada, (não racionalmente por Van Gogh, mas a todos outros que se beneficiam) ecoam para uma série de jovens artistas, esperando na fila alguém que vislumbre esse raio de sol.

Racionalidade e expressão caminham juntos na mesma muleta de alguém não apenas "gauche", mas também "droit". De um lado, a possibilidade de entender que a produção artística anda junto com um senso de autonomia. No outro pé, o trabalho duro, muito duro. O que rege o que irá ficar ou não para a posteridade independe do desejo do próprio artista. Não são todos que caem na fina malha do tempo, mas às vezes fatores de estar no lugar certo, na hora certa, também ajudam na grande corrida ao ouro.

Nem todos tem um irmão como Theo para assegurar um conforto e sobrevivência necessário para o grande tempo. Nem todos poderão ser o joguete de um dispositivo mercadológico. Mas, na melhor das hipóteses, sempre haverá enriquecimento de alguma parte que lucra com anseios e sonhos. E se for artístico, melhor ainda.

o exercício da autobiografia

dos nomes:
Tê, Mindinha, Caxinha, Nariz; mas prefere mesmo quando escrevem o nome com acento.
gosta de cogumelos, tem alergia à camarão.
como tem problemas em escrever em 1o. pessoa, usa a 3o.
do ménage, prefere o duplo. é divorciada.

[um dia, teve um breve colapso e quis jogar-se da ponte. já era noite e quase não lembra como tudo aconteceu]

o pai é comunista, com família sírio-libanesa. a mãe, pedagoga de origem japonesa e silêncios mortais junto ao tlec-tlec do relógio. Já me chamaram de sushi com quibe.

tem Francisco Alvim como inspiração. mas o humor oscila entre o butô e o tropicalismo.

Girassol.
Evandro Carlos Jardim.
A meia noite no quarto de cima, o Cruzeiro do Sul.
diferente ou desnecessário.
CTH, 28 anos, escorpião com ascendente em peixes.

[nisso tudo, uma ou várias mentiras]

sábado, 7 de dezembro de 2013

a elegia como princípio estrutural

(...) A poesia elegíaca se distingue não por uma erupção lírica de desgosto e melancolia, e sim por um pungente, embora distintamente atenuado sentimento de perda e tristeza. O traço contemplativo deste gênero cria uma sensação de distância que torna mais polida a experiência lírica imediata. A poesia elegíaca é, portanto, caracterizada por dois modos de expressão distintos: trata-se de um gênero pessoal e autocentrado que, simultaneamente, minora os sentimentos de perda e dor através do ato da contemplação.
A tensão antitética que subjaz à poesia elegíaca advém da integração de diferentes momentos temporais num único espaço lírico. Quando o passado e o presente se encontram, como costuma acontecer na poesia elegíaca, o passado é retomado e situado no contexto do presente. A poesia elegíaca une o passado ao presente de modo a desnudar a ambos de suas funções específicas: "O passado é conjurado ao tempo presente de modo que forme uma antítese à nossa experiência momentânea. A descrição do momento presente perde seu caráter de experiência e torna-se algo mais universal"(WEISSENBERGER). Tal integração de instâncias temporais díspares - o passado e o presente - contribui para o efeito produzido pela elegia de aliviar a angústia provocada em nós pela morte e pela perda em geral. A elegia alcança este efeito mediante a justaposição de tristeza e alegria. Elegias contrastam o fim da vida com as memória de alegrias anteriores, e - diante da dor iminente - trazem à mente momentos mais idílicos.

[Os retratos cinematográficos de Sokurov. Eva Binder em Alexander Sokurov: poeta visual. p. 56-67]

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

1 mês

primeira vez que vi o pôr-do-sol na minha nova casa.
um grande caminho entre os ladrilhos chineses e as três torres, gigantes e irmãs.
nisso tudo, um cheiro de hortelã e um acordar alguns minutos antes.

trocar o vocabulário para o cansaço das palavras.