Por fim, Totaro propõe uma explicação para o caráter hipnagógico (de transição entre vigília e sono) do cinema de Sokúrov, citando um trecho do ensaísta Phillip Lopate, que analisa não o cinema do diretor russo, mas dois cineastas que estes também tomou como modelos, o francês Robert Bresson e o japonês Kenzo Mizoguchi:
Pode parecer afetado falar em assistir a um filme como disciplina meditativa (…), mas há paralelos. Existe um conhecido tipo de meditação que foca a atenção mediante a repetição de um único som ou imagem mental. Não obstante, outras práticas de meditação encorajam a pessoa em repouso a deixar seus pensamentos fluírem livres e desordenados, sem tentar ancorá-los em ponto nenhum. (…) No início, eu costumava resistir e deixar que minha mente vagasse durante a projeção dos filmes e lembrava-me que que estava desperdiçando o preço do ingresso. Mas, assim como na meditação budista a pessoa é ensinada a não repelir os pensamentos mesquinhos ou tolos que surgem, já que essas "distrações" são precisamente o material que constrói a meditação, assim também comecei a permitir que minha mente espectadora fílmica bradasse mais livremente minhas preocupações, ansiedades e lembranças cotidianas que surgiam de alguma associação de imagens. As vezes, perdia-me em alguma corrente mental por vários minutos, antes de retornar toda a minha atenção para o que se passava na tela; mas, quando voltava a ela, era com uma consciência renovada, uma maior profundidade de sentimentos. (…) Certos tipos de filme - aqueles com recursos estéticos austero; passada não precipitada; consistência tonal; a tendência a planos longos que se opõem a close-ups; a atenção para as sombras e para o background; e a aceitação madura do sofrimento - me proporcionam um espaço maior para a meditação.
LOPATE, Phillip. Totally, Tenderly, Tragically. Nova York: Anchor Books, 1998, cit. Donato Totaro, revista Kinoeye, 1999.
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